domingo, 4 de janeiro de 2009

Logo no meu telhado.

Sexta-feira à noite. Eu chego a casa cansado de um dia árduo de trabalho e não tenho nada para mim, nenhum filho esperando pra falar que tirou notas boas na escola, nenhum amigo me ligando pra ir tomar cerveja, nenhuma mulher me esperando pra me satisfazer a fome e depois me satisfazer a fome, se é que você me entende. Faz dois meses que eu me divorciei, estou morando aqui nesse apartamento alugado, ainda não desfiz minhas malas porque tenho uma falsa esperança de que ela vai me ligar pedindo pra voltar comigo, as esperanças são as últimas a morrer, até mesmo as falsas. A única coisa que me restou foi uma facada que o governo apelidou de “pensão”, uma frigideira e um gato chamado Arthur. Gato este que nunca está em casa quando eu chego, anda a noite inteira pela rua atrás de gatas pra trepar nos telhados alheios... O desgraçado tem a vida que eu queria ter. Troco de roupas, coloco o micro-ondas pra esquentar um miojo e ligo a tv pra assistir o jornal, durmo antes do miojo e do jornal.

Sábado de manhã. Eu acordo cedo para fazer exatamente nada, sento à mesa da cozinha e fico olhando o celular, esperando que ele toque e seja minha mulher me pedindo pra voltar, faço isso enquanto como o miojo da noite anterior, que me esperou a noite inteira fielmente dentro do micro-ondas, diferente do gato, que essa noite decidiu trepar logo no meu telhado, e não me deixou dormir direito. Agora ele está sentado no sofá que fica na minha frente, me encarando, como se fosse me bater a carteira e correr.

Sábado de noite. Eu ainda não tomei banho e provavelmente não vou tomar, sinceramente nem me importo mais com o meu cheiro, o gato se importa, não me abraça nem me lambe, como os gatos dos filmes fazem.

Domingo de manhã. Eu acordo com o celular tocando, meio sonolento eu atendo.


- Alô?

- Helquer? É a Inês, quero conversar com você...


Eu dou um salto da cama, minha mulher me ligou, está tudo chegando ao fim, verei meus filhos novamente, sentirei o gosto da boca dela e não precisarei mais morar num lugar onde minha única companheira é uma cama de solteiro.


- Oi Inês! Sim, sim! Vamos conversar!

- Helquer, eu quero que saiba que eu realmente gosto de você...

- Sim! Sim!

- ... Não posso mais viver do jeito que estou vivendo...

- Sim! Sim!

- ... A polícia me mostrou fotos de você rondando minha casa na semana passada, Helquer.

- O que?! É mentira!

- Eu sinceramente não posso viver aqui com as crianças, não enquanto você continuar sendo essa pessoa doentia que você é. Eu preciso de paz, eu preciso recomeçar, eu preciso encontrar alguém pra me apaixonar de verdade.

- Inês!

- Adeus, Helquer. Dê um beijo no Arthur por mim.


Domingo à noite. Este barulho, grito, choro, miado, sei lá o que é este barulho. Sei que está me irritando profundamente. Eu abro a porta do micro-ondas e quebro o maxilar de Arthur.

Agora vou poder dormir em paz.


(Por: C.O.)

4 comentários:

Marcus vinicius disse...

Realmente assutador.

Anônimo disse...

etalelê

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

e aquela merda daquele barulho que só grita no silêncio?